14 March 2012

Envelhecimento activo (nas palavras de Maria Brito de Azevedo)

Maria Brito de Azevedo
A noção de envelhecimento ativo remete-nos, comumente, para uma aceção mais direcionada para os desafios demográficos e suas implicações sociais e económicas e, embora reconheça a pertinência dessas questões, bem como, a sua complexidade, trespasso esse papel a quem o devir.
Como enfermeira cuido na simplicidade. Cuido de pessoas. Não cuido de números.
Perdoem-me, mas a mim não me interessam estatísticas. Não me interessam normas. Não me interessam regulamentos. Não me interessam números.
Almejo a autossuficiência da Pessoa. Almejo que as Pessoas se conheçam. Verdadeiramente. Que compreendam os meandros da mente sobre o corpo. E que resgatem o seu poder. Almejo consciencializar as Pessoas que há qualidade de vida para além do espetáculo de marionetas da nossa mente. Que entendam que a melhor prescrição, que a melhor regulamentação, que as melhores diretrizes são aquelas criadas dentro de mim. E que a melhor farmácia e o melhor consultório habita em mim.
Como cuidadora quero saber quem são as Pessoas na sua essência e, acima de tudo, que elas saibam quem são. Que se questionem porque recorrem a bengalas prejudiciais à sua saúde, ao seu próprio ser, ao que de mais precioso têm…o seu Eu. Porque fogem do Amor-próprio.
Culturalmente, temos um longo caminho a percorrer, pois construímos demasiados estereótipos sobre a noção de envelhecimento. Construímos atores externos e delegámos-lhes funções que deveriam ser nossas. Fantasiámos sobre os seus poderes, construímos personagens sábias e eruditas mas, acima de udo, externas. E minimizámos o Actor principal. O Eu que em mim habita.
Mudemos o discurso, redirecionemos o nosso olhar. Pensemos em saúde, pensemos nas “pessoas enquanto pessoas” (Comissão Independente População e Qualidade de Vida, 1998). O envelhecimento ativo não pode ser “bem-sucedido” repetindo e generalizando padrões, como se de números se tratasse.
Que espécie de mundo teríamos se a padronização da noção de envelhecimento ativo fosse sinónimo de saúde? Certamente, teríamos um mundo uniforme que numa primeira análise traria benefícios pois deixaria de ter um carácter subjetivo. Para além disso, a padronização ilibar-nos-ia do sentimento de culpa relativamente às nossas ações, ilibar-nos-ia da responsabilidade, pois estaríamos simplesmente a replicar o que está padronizado e, em última instância, aceite.
Compreender que o mundo e que o papel mais ou menos ativo do envelhecimento é fruto de nós mesmos, dos nossos constructos é o primeiro passo. Tarefa difícil, é certo. Contudo, é o seu carácter desafiador que o torna aliciante.
Questionar sobre qual o papel do enfermeiro no envelhecimento ativo é questioná-los sobre quem são e sobre quem querem ser. Qual a nossa perceção de envelhecimento ativo? É de Amor ou de Medo? A resposta deliberará o futuro. O nosso futuro enquanto cuidadores e inevitavelmente o futuro de quem cuidamos.
Subscrevendo António Fonseca (2006), a forma como concebemos o envelhecimento afeta a forma como o envelhecimento é aceite pelos demais o que por sua vez tem repercussões ao nível dos comportamentos adotados. Então, como desejamos ou, melhor, como idealizamos um envelhecimento ativo?
Poderão ser criadas todas as políticas, todos os programas mas estes nunca resultarão se a dúvida e os estereótipos persistirem.
Tudo está. Tudo é. Tudo começa. Tudo termina na mente.
Já que é para fantasiar que fantasiemos sobre um novo e intransmissível conceito de envelhecimento ativo. E não nos deixemos contagiar por conceções culturais, económicas, políticas e tudo o que nos seja exterior. Fantasiemos sobre o nosso próprio envelhecimento. Criemos a nossa própria realidade.

1 comment:

  1. Obrigado Maria por expores com esta clareza o conceito de activo!

    Para mim, activo será tomar parte na decisão, participar de forma esclarecida nos cuidados, é ter autonomia, e potenciar as capacidades próprias...

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